A pobreza concreta de Francisco

O carisma e o amor 

São Francisco de Assis é um dos santos mais venerados pela cristandade. A sua vida caraterizou-se por um profundo amor a Deus e ao próximo, em particular os mais pobres e necessitados.

Francisco nasceu em Assis no ano 1182 numa família abastada. Depois da juventude passada entre prazeres e diversões, em 1206 teve uma experiência de conversão que o levou a mudar radicalmente a sua vida.

Despojou-se de todos os seus bens e começou a viver uma vida de pobreza evangélica. Juntamente com outros companheiros, Francisco fundou a Ordem dos Frades Menores, que sem empenhava e viver segundo a Regra de São Francisco, baseada sobre a pobreza, a humildade e o amor pelo próximo.


ATENÇÃO E COMPAIXÃO

O amor de São Francisco pelos pobres manifestava-se de diversos modos. Ele dedicava-se a eles com atenção e compaixão, ajudando-os materialmente e espiritualmente. Francisco visitava muitas vezes os hospitais e as prisões, onde confortava os doentes e os presos. Dedicava-se também à pregação, convidando as pessoas a imitar o exemplo de Cristo e a servir os pobres. O seu ensinamento é claro: todos os seres humanos são iguais, independentemente da sua condição social. Os pobres merecem o mesmo respeito e a mesma atenção que os outros.

A PREGAÇÃO AOS PÁSSAROS

Um episódio emblemático do testemunho de Francisco em relação aos pobres é o da pregação aos pássaros. Francisco dirigiu-se para um campo e começou a pregar aos pássaros, que o ouviram em silêncio. Este episódio foi interpretado como um símbolo do amor de Francisco por todos os seres vivos, mesmo os mais pequenos e indefesos.

ver: A pregação aos pássaros

A célebre “pregação aos pássaros”, segundo a Legenda Maior, teve lugar em Piandarca, uma área verdade incontaminada entre Cannara e Bevagna. E também Tomás de Celano confirma o episódio, colocando-o nesta localidade.

Escreve São Boaventura que Francisco, “aproximando-se de Bevagna”, parou numa clareira onde tinha marcado encontro “uma multidão imensa de pássaros” (FF, 1206).

O santo dirigiu-se a estas criaturas, como se fossem dotadas de intelecto, e exortou-as a louvar a Deus. E o biografo, depois, descreve a reação dos voláteis: “os passarinhos, gesticulando numa maneira maravilhosa, alongavam o pescoço, estendiam as asas, abriam o bico, olhando-o com olhar fixo”.

Giotto di Bondone, entre 1295 e 1299, representa esta cena, entre as mais famosas do ciclo de frescos na Basílica Superior de Assis. De facto, é um episódio muito amado pela devoção popular. Provavelmente, lembra a capacidade de Francisco de se dirigir aos últimos de maneira compreensível. O rosto do santo, no fresco, exprime doçura. E também o fundo é muito simples, com árvores representadas com tamanho natural.

Segundo uma biografia de Ruggero di Wendower, os factos narrados desenrolam-se, ao invés, em Roma. O Papa tinha acabado de conceder a Francisco e aos seus seguidores o ofício da pregação. E os frades, construíram um oratório na Urbe, dedicam-se incessantemente à difusão do Evangelho.

Mas o povo romano despreza-o e rejeita o seu ensinamento. A esta hostilidade Francisco responde: “irei embora daqui a anunciar Cristo aos animais feios e aos pássaros do ar; esses ouvirão estas palavras de salvação e obedecerão a Deus com todo o coração”. 

Podemos pensar, lembra padre Enzo, que as pregações aos pássaros tenham sido mais de uma, e os lugares diversos. E também em Alviano, na província de Terni, se repete um episódio semelhante.

Escrevem as fontes que Francisco, reunido o povo para pregar, “não se conseguia fazer ouvir por causa das andorinhas, que tinham o ninho mesmo ali, e chilreavam com toda a força” (FF, 1207). Também nesta ocasião se dirige aos penudos pedindo para ser ouvido. As andorinhas “quase como se fossem dotadas de intelecto, calaram-se imediatamente”, anota São Boaventura, e estes prodígios contribuem para aumentar a fama do santo.

A MULHER DOENTE

Um outro episódio, narrado pelas Fontes Franciscanas, aconteceu na praça em Assis. São Francisco encontrava-se a pregar naquele lugar quando viu uma mulher pobre e doente que pedia esmola. A mulher apresentava-se tão mal que não conseguia estar de pé e estava para cair por terra. Francisco aproximou-se da mulher e ofereceu-lhe a sua mão. A mulher olhou-o com olhos cheios de gratidão e apoiou-se a ele.

Francisco conduziu-a a um lugar seguro e deu-lhe de comer e de beber.

Depois de a ter confortado, Francisco disse-lhe: “Não precisas de pedir esmola. Eu e os meus irmãos te ajudaremos”. Francisco e os seus frades dirigiram-se a casa da mulher e ofereceram-lhe comida, roupa e um lugar onde dormir. A mulher ficou tão grata pela ajuda que começou a chorar.

Francisco disse-lhe: “Não chores, irmã. Deus está contigo”. A mulher continuou a viver com Francisco e os seus frades por muitos anos. Foi uma inspiração para todos aqueles que a conheciam, o seu testemunho de amor e compaixão continua a inspirar as pessoas ainda hoje.

OS PEDINTES  

Uma outra vez, São Francisco encontrava-se a pregar numa aldeia quando viu um grupo de mendicantes que tinham sido expulsos da cidade.

Os pedintes estavam famintos e com sede, e não tinham um lugar onde dormir. Francisco aproximou-se dos pedintes e disse-lhes: “Não tenhais medo. Eu e os meus irmãos vamos ajudar-vos“. Francisco e os seus frades levaram os mendigos para um convento e deram-lhes de comer e beber. Depois, ajudaram-nos a encontrar um trabalho e um lugar onde viver. Os mendigos ficaram tão gratos pela ajuda de Francisco que começaram a cantar e a dançar. Francisco sorriu e disse: “Este é o modo melhor para agradecer a Deus”.

São Francisco, pobre entre os pobres

Despojar-se, das roupas e de tudo

Despojar-se, das roupas e de tudo; despojar-se do passado e de si próprio, sobretudo; tornar-se pobre entre os pobres: é São Francisco d’Assis.

Não é por acaso, então, que entre as várias denominações inventadas para ele esteja a de “Pobrezinho de Assis”: pobrezinho, mas rico de Cristo, de Deus e da Virgem Maria, uma riqueza que não se conta, que não se pode colocar sobre a mesma balança.

O imaginário coletivo está cheio de fotogramas de Francisco que naquele despojar-se se torna filho da pobreza, irmão da irmã pobreza, esposo da “Senhora Dona pobreza” como ele mesmo a definirá: entre as muitas, além da imagem, “cult” d Giotto na basílica superior de Assis, não é possível esquecer aquela “pintada” por Franco Zeffirelli no seu “Irmão sol irmã lua”; o santo de Assis, diante do pai Bernardone e do bispo da cidade umbra, fica todo nu, assim como a nua terra.

Mas a terra, sabemo-lo bem, produz frutos e plantas, é verde e resplandece por baixo do sol, também ele nu, e, contudo, assim belo e esplêndido de maneira única e excecional.

Mas para que eu não proceda demasiado fechado, / Francisco e Pobreza para estes amantes / toma neste momento no meu falar difuso” assim descreve Dante, no XI canto do Paraíso, esta ligação indissolúvel entre Francisco e a pobreza.

Despojar-se para São Francisco é poder ser “vazio” para ser cheio da Graça de Deus, dom celeste que ardentemente deseja e que pede a Deus-Abbá-Pai.

Os frades não se apropriem de nada, nem casa, nem lugar, nem alguma outra coisa. E como peregrinos e forasteiros neste mundo, servindo ao Senhor em pobreza e humildade, vão pedir esmola com confiança.

Não se devem envergonhar, porque o Senhor se fez pobre por nós neste mundo. Esta é a sublimidade da altíssima pobreza aquela que vos constituiu, meus irmãos caríssimos, herdeiros e reis do reino dos céus, vos fez pobres de coisas e ricos de virtudes”, assim está escrito na Regra bulada (de 1223) da Ordem no capítulo VI, que tem como título “Que os frades de nada se apropriem, e do pedir esmola e dos frades enfermos”.

São Francisco conhece bem o que quer dizer, portanto, ser pobre porque experimenta ele mesmo este estado, todos os dias da sua vida. Sabe de que coisa precisa um pobre, experimentando ele mesmo a pobreza. Mas ele, fá-lo por opção, decide-o: é importante recordá-lo.

Outra coisa, ao invés, quem se encontra nesta condição de precariedade de víveres, de roupa e outras. E diante disso qual é a sua atitude? Também nesta ocasião, toma outra decisão: ir ao encontro deles, e partilhar com os pobres aquele pouco que tem.

Ele, imitador de Cristo, sabe bem a riqueza da partilha: Cristo é para ele o modelo; o próprio Jesus que na última ceia partilha com os seus discípulos o Pão da Vida, todo o seu ser.

Um quadro pintado por volta da metade do XV século, Domenico di Bartolomeo (chamado Domenico Veneziano) imortal o santo de Assis durante o seu “matrimónio com a senhora Pobreza”, este é o titulo da obra: Francisco, com o seu olhar dirigido para as mãos da senhora Pobreza, coloca o anel das místicas núpcias no seu dedo; a mulher que incarna a Pobreza tem um sorriso leve e tem toda a atitude de quem se sente honrada pelo amor de Francisco d’Assis.

Aquilo que sobressai é esta correspondência de amor entre os dois: é o Amor a Deus que os une, aquele Amor que para Francisco d’Assis quer dizer estar ao lado dos pobres, dos irmãos necessitados, de quem “tem fome e sede”.

A cena é contornada por uma cor dourada brilhante como fundo; “ouro” porque a partilha é sempre preciosa.

OS FRADES E AS OBRAS DE CARIDADE

O testemunho de São Francisco em relação aos pobres é um exemplo de amor compassivo que continua a inspirar as pessoas ainda hoje.

A sua mensagem é ainda atual, num mundo em que a pobreza é ainda um problema dramático. Francisco deixou uma herança profunda na Igreja e na sociedade. A ordem dos Frades Menores continua a trabalhar em todo o mundo para servir os pobres e os necessitados. Além disso, o exemplo de Francisco inspirou o nascimento de numerosas obras de caridade e de solidariedade que se dedicam a ajudar os pobres.

Gelsomino Del Guercio

Publicado em 16-10-2023, sanfrancescopatronoditalia.it

Tradução: frei José Augusto Marques

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