Testemunho missionário
Hoje partilhamos o esplêndido testemunho da irmã Rosanna, freira franciscana missionária durante 40 anos na Argélia. As suas palavras já dizem tudo: louvado sejas meu Senhor, pela vida gasta, pela alegria partilhada, pela fadiga que nos faz caminhar.

Olá a todos, chamo-me Rosanna, e sou uma freira do instituto das “Franciscanas Missionárias de Maria”.
Estou contende de partilhar convosco a minha experiência de vida enriquecida e transformada pela relação com o Senhor que verdadeiramente “realiza coisas grandes”, transformando as existências em verdadeiras e próprias aventuras luminosas onde somos chamados em primeira pessoa a enfrentar e viver!
Não é por acaso que usei estes dois verbos: enfrentar e viver!
Como mulher de montanha, nasci e cresci no meio dos Alpes Orobie no alto Val Seriana, e posso dizer que a vida é como um caminho na montanha: durante a subida existem pedaços onde a fadiga não se sente e o lugar que nos rodeia pode verdadeiramente “roubar-nos o respiro” da beleza, mas alguns pedaços, onde a subida começa a fazer-se mais ingreme, a beleza à nossa volta começa a desaparecer porque a nossa atenção e os nossos pensamentos se concentram sobre o folego e sobre a energia a colocar nas pernas e o nosso olhar, como que enevoado, olha a estrada que estamos batendo.
A subida a um certo ponto leva a um plano e, levantando os olhos ainda cansados e afanados, encontramo-nos num grande prado verde do qual partem as grandezas dos cimos rochosos onde, chegados lá, no admirar a grandeza da criação que se pinta diante de nós e a satisfação de a ter conseguido, dou-me conta de ter vivido em cheio este dia de montanha.
Na vida, seja qual for a estrada que nos sentimos chamados a percorrer, existe e existira a estrada em subida, mas esta torna-se a nossa subida, uma subida luminosa porque sabemos a beleza que encontraremos no final desta aventura: “consegui!”.
Voltando à minha história, como todas as histórias, teve um início: nasci em 1942 em Ardesio, uma pequena aldeia acorrentada precisamente, no meio das montanhas, na província de Bergamo. A aldeia, como quase todas as realidades rurais da Itália de então, era muito unida e desde pequena respirei a unidade da comunidade e das famílias, inclusive a minha.

A minha família era das mais numerosas, eramos doze, dez entre irmãos e irmãs e os meus pais: eu sou a penúltima. Recordo aqueles anos com muito afeto, não tínhamos muito, diria que apenas o necessário para viver, mas de modo muito forte muitos valores enriqueciam o nosso estar juntos… gosto sempre de recordar quando á noite, à volta da mesa, todos os doze, o número dos apóstolos, recitávamos o Rosário.
A minha infância era tranquila: ia à escola, ajudava a mãe na horta, brincava com os amigos e ia com toda a família à nossa igreja à missa e às várias celebrações.
Na nossa terra há um Santuário dedicado a Nossa Senhora das Graças, não percebia porquê, mas quando passava diante do santuário sentia-me atraída a entrar, e quando entrava punha-me no banco sentada, rezando um pouco e admirando a beleza do lugar, sentia sempre grande paz.
Alguns anos depois comecei a perceber porque é que sentia tão importante e forte aquele lugar: tinha quatorze anos quando fui ao Tríduo de preparação para a festa da Imaculada. Na Santa Missa conclusiva senti forte dentro de mim o chamamento à vida missionária. Mantive em segredo esta forte voz interior, até aos dezanove anos disse aos meus pais: não ficaram nada contentes.
Pus-me a procurar um Instituto Missionário e com a ajuda do meu pároco contactei as irmãs Franciscanas Missionárias de Maria, que tinham uma comunidade em Milão. Fui passar alguns dias para as conhecer e fazer experiência comunitária.
Aqueles dias foram muito significativos e espiritualmente fortes: sentia-me em casa e atraída pelo lema que a fundadora, Maria da Paixão, deu à família religiosa: “ADORAÇÃO E MISSÃO”! Tudo parte do Senhor, da relação com Ele, para depois ser portadora daquela Relação a todas as pessoas que encontro.
No final desta experiência regressei á vida de sempre, trabalhava na fábrica e fazia muitas outras coisas: aquela voz, acompanhada por aqueles dias em Milão, eram sempre mais fortes!
Com quase vinte e três anos decidi-me a realizar este meu desejo e partir para o convento. Minha mãe não estava contente, não queria que me fosse embora de casa, meu pai era totalmente contrário, pensai que me disse: “nunca te irei ver”!
Para mim não foi simples, chorei muito por esta coisa, mas confiei e posso dizer que verdadeiramente o Senhor arruma no seu lugar todas as coisas: meu pai, que não queria ir ver o lugar onde eu estava e viver comigo aqueles primeiros passos tão importantes, foi o primeiro que veio a Grottaferrata aos meus primeiros votos e aos Carceri aos votos solenes!
O meu desejo era o de partir para a África central, afinal fui mandada para a África do Norte: o meu primeiro ano vivi-o na Tunísia para estudar o Árabe, mas era demasiado literário, para poder viver e trabalhar com as pessoas devia aprender o dialeto! Terminado o ano na Tunísia fui mandada para a Argélia onde gastei tantos anos da minha vida.

No início não foi fácil. Eramos quatro irmãs, as únicas cristãs no meio de um povo todo muçulmano. Naqueles primeiros tempos a minha força foi a vida fraterna e os conselhos de uma irmã idosa com muita experiência. Não obstante a base de árabe que tinha estudado, depois de ter aprendido um pouco a língua mi arranjei que fazer e pus-me a trabalhar com as raparigas, quase todas eram analfabetas.
Pus de pé, sempre com a ajuda das autoridades locais, em todos os lugares onde estive, alguns centros para as raparigas.
Conto-vos a vida de uma destas raparigas: encontrei-a que tinha 9 ou 10 anos, levava as cabras de seu pai a pastar, era a primeira de 9 filhos. Depois de um bom pouco de tempo, consegui convencer o pai a deixá-la vir ao centro para que pudesse aprender alguma coisa. Em pouco tempo começava a ler e escrever, a cozer e bordar: tinhas umas mãos de ouro.
Graças a estas bases conseguiu convencer todos os seus irmãos a irem à escola e continuou a estudar obtendo os diplomas necessários para ensinar. Agora é professora numa escola profissional e casou-se com um ótimo rapaz.

Muitas raparigas, graças à nossa ajuda, puderam ter uma história semelhante à desta jovem. As pessoas gostavam muito de mim, podia entrar em todas as casas como se fosse a minha!
Na Argélia a lei não permitia o anúncio do Evangelho, portanto a nossa vida devia ser um Evangelho vivente e as pessoas percebiam-no: muitas vezes, no final das festas Islâmicas, as pessoas traziam-nos uma espécie de pão e carne de cabra para partilhar connosco a sua alegria. Sentiam-se contentíssimos de nos ajudar!
A nossa Igreja era muito pobre, tínhamos apenas um pequeno altar com um Crucifixo e uma pequena reserva eucarística para a Adoração. Não podíamos ter a missa todos os dias, e nem sequer todas as semanas porque não tínhamos sacerdotes nas vizinhanças. Uma vez, era o dia de Páscoa, soube que um bispo estava de viagem e devia passar pela nossa zona. Consegui contactá-lo para lhe pedir que nos celebrasse a Missa de Páscoa, caso contrário teríamos ficado sem a Eucaristia.
Não tínhamos as partículas “tradicionais”, e na falta de matéria prima, fazíamos consagrar uma espécie de pão ázimo que nos ofereciam as famílias muçulmanas que viviam perto de nós e ficavam muito contentes quando lhes dizíamos que tínhamos rezado com o pão deles! Era um pequeno modo para criar relação.

Aprendi muito com eles, faziam sempre referência a Deus, em todas as coisas! Tinham um sentido forte da partilha e uma grande confiança na Providência.
Vivi quarenta anos com eles, na Argélia, e devo dizer que depois dos primeiros anos difíceis para aprender a língua e entrar na sua cultura, o resto passou rápido.
Nestes anos houve dez anos de terrorismo. Houve a morte de dezanove pessoas entre religiosos e freiras. Entre estes também sete monges, que muitos de vós terão ouvido chamar como os “mártires argelinos”. Alguns deles conhecia-os. Foi o momento mais duro, tínhamos medo, mas sempre nos susteve a unidade da Igreja, como dizia antes é uma igreja pequena, pobre, mas que vive o Evangelho! Sentíamo-nos todos unidos!
Na Argélia é uma missão um pouco especial, mas é importante para o diálogo da vida, o diálogo que cria vida! Todas as vezes que ouvia ou regressava a casa perguntavam-me: “quantos converteste?” e a minha resposta era e ainda é esta: “devo ainda converter-me eu, imaginai se posso converter os outros”.
Antes despartir para a missão se calhar eu também tinha esta visão, isto é que o missionário converte os povos, mas depois destes tantos anos de experiência experimentei que é o Senhor, que conhece os corações, que converte e faz iniciar caminhos de beleza entre o Criador e a criatura!

Regressei a Itália há um pouco de anos, mas encontrei a Igreja italiana mais velha de como a tinha deixado. Noto que está ainda muito ligada ao passado, cuidando-se muitas vezes de coisas superficiais. Parece-me que muito é a dificuldade para as mudanças… Penso que as Igrejas de missão podem ser um ensinamento para as nossas Igrejas europeias e também para as nossas comunidades religiosas.
Caros jovens e caros todos que lestes estas minhas linhas que resumem oitenta anos da minha vida, não tenhais medo das crises, tive muitas também eu e consegui superá-las com a oração, o acompanhamento espiritual e a vida fraterna. Tomai o tempo para escutar o Senhor que vos fala, nos tantos modos que usa para chegar a vós, não tenhais medo de responder! Ele caminha convosco, e posso garantir-vos, fiz experiência disso.
Unidos na oração!
suor Rosanna Bigoni fmm

– info@vocazionefrancescana.org
Artigo de fra Nico Melato
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