Oração … uma inutilidade necessária

Pequeno percurso sobre a oração #5

Perder tempo. Esta tornou-se talvez uma opção que não nos podemos mais permitir ou que não nos queremos sequer conceder, apenas para aumentar os sentimentos de culpa vários pensando nas coisas que se poderiam ter feito, entretanto.

De facto, se nos perguntássemos qual é a caraterística principal de uma “perda de tempo”, não teríamos dificuldade em responder: “a inutilidade”. Eis, portanto, aquilo que provavelmente nos incomoda do tempo perdido: a sua improdutividade, o sentimento de não ter obtido nada, a falta de respostas ou de situações que esperávamos, a ausência de soluções.

A partir do momento que estamos imersos numa sociedade que nos estimula continuamente a ser eficientes e produtivos, vistas as nossas vidas que por vezes nos pedem saltos mortais entre compromissos laborais, cuidado da família e das pessoas queridas, educação dos mais pequenos, no final corremos o risco de combater verdadeiras cruzadas contra qualquer dispersão que nos possa causar atrasos sobre os nossos ritmos e sobre as cosias a fazer.

E a oração não está isenta destas considerações, pelo contrário! Na maioria das vezes de facto estou seguro que nos aconteça também a nós pensar que a oração seja uma perda de tempo, que não “funcione”: não sentimos nada, não se realizam as mudanças que pedimos, não recebemos respostas às nossas perguntas, etc.

Hoje porem, não estamos aqui a recriminar um semelhante comportamento, mas antes a dizer: está bem assim!

Sim, porque talvez um dos primeiros modos com que podemos voltar a apropriar-nos de um certo gosto pela oração é mesmo o tomar consciência da sua inutilidade.

De resto, como todos os atos de amor que nos veem envolvidos juntamente com as pessoas que nos são queridas, também a oração vive, na maioria das vezes, do simples “estar” com o Senhor, sem a pretensão de obter qualquer coisa de volta, que seja uma iluminação ou uma consolação.

Torna-se assim, pouco a pouco, ocasião para reconhecer e contemplar os movimentos, os olhares, os suspiros, as palavras do Outro que está à nossa frente.

Embora, portanto, haja diversos “tipos” de oração nos quais nos é dado “fazer” alguma coisa (o louvor, a intercessão, o pedido de uma graça, o pedido de perdão, etc.) aquela que nós chamamos simplesmente “contemplação” torna-se o espaço privilegiado onde não fazer nada e podermo-nos dar conta profundamente da presença de Deus, da sua ação, da sua beleza. Não digo que seja fácil (quanta fadiga a aprender a não fazer nada!), mas estou certo que esta atitude da oração contemplativa nos permita restituir respiro ao dia a dia, sobretudo graças ao espanto.

Assim aconteceu, imagino, a são Francisco. Fica-nos marca disso numa oração, chamada “Saudação à Virgem”:

Ave, Senhora, santa rainha, santa mãe de Deus,
Maria que és virgem feita Igreja e eleita pelo santíssimo Pai celeste,
que te consagrou juntamente com o santíssimo seus Filho dileto e com o Espírito Santo Paráclito;
tu em quem foi e é toda a plenitude de graça e todo o bem.
Ave, seu palácio, ave, seu tabernáculo, ave, sua casa.
Ave, sua vestimenta, ave, sua serva, ave, sua Mãe.

E saúdo vós todas, santas Virtudes, que por graça e iluminação do Espírito Santo vindes infusas nos corações dos fiéis, para que de infiéis, fiéis a Deus os torneis.

Neste texto lemos o testemunho de uma atitude só contemplativa: mesmo dirigindo-se a Maria, Francisco não avança nenhum pedido nem intercessão. Simplesmente olha, com espírito meditativo e contemplativo.

Maria é considerada com olhar admirado através de uma série de títulos, dos quais alguns comuns (rainha, mãe, serva), outros centrados sobre a sua capacidade de conter o Senhor (palácio, tabernáculo, casa, veste) e um outro mais fora do comum e teológico (Virgem feita Igreja) mas bem enraizado na tradição patrística. Maria é perscrutada na sua relação com as pessoas da santa Trindade e saudada com o eco das palavras do anjo Gabriel.

são Francisco que contempla e dialoga com Maria

A pouco a pouco então, depois das orações que já vimos anteriormente (relativas ao período da “conversão” de Francisco), damo-nos conta que o santo de Assis se vai deixando lentamente da sua oração de meditação: admiramo-nos pela sua reflexão que sabe perscrutar a realidade da vida cristã, como as virtudes (na oração “Saudação ás virtudes”) ou que se fixa a contemplar a Virgem Maria porque nela ele reconhece uma boa síntese do mistério da salvação.

Lê as coisas de sempre mas lê-as com um olho novo! A atitude contemplativa então fica-se a olhar com a atenção o objeto da sua consideração, sem a pressa de chegar a conclusões operativas ou de tirar daí bons propósitos. Parar a contemplar o mistério parece-lhe já suficiente, pois que esta mesma contemplação tem já um efeito transformador.

É indício disso, por exemplo, a referência ao Espírito Santo, único verdadeiro protagonista agente no coração do homem que permite ao próprio homem fazer emergir aquela raiz, aquela marca e aquele reconhecimento que nos liga ao nosso criador.

Assim, espero, também nós metendo de parte toda a tentação “utilitarista” em relação á oração podemos sair daquela polaridade que contrapunha a contemplação (passiva, por obra de apenas algumas pessoas “eleitas”) à ação (ao fazer, capacidade garantida a todos aqueles que não podiam elevar-se das preocupações da carne) e descobrir a profunda unidade que existe nestes dois movimentos para poder realizar um autêntico e sempre mais maravilhado seguimento do Senhor Jesus.

fra Andrea Bosisio

 – info@vocazionefrancescana.org

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